Convidados apresentaram posicionamentos divergentes durante evento
Uma audiência pública para debater sobre a regularização fundiária das chácaras de recreio foi realizada nesta quinta-feira, 22 de setembro. O evento foi organizado pela Comissão de Obras e Serviços Públicos, composta pelos vereadores Helder do Taxi (MDB), presidente; Ceará (Republicanos), vice-presidente; e Waguinho da Santa Luzia (Cidadania), secretário. O objetivo foi discutir a possibilidade de ampliar a data limite para a regularização das chácaras de recreio, que por determinação de lei federal (Lei Nº 13.465/2017) seria para núcleos constituídos até dezembro de 2016.
Participaram da reunião o presidente da Câmara Municipal de Limeira, vereador Sidney Pascotto, Lemão da Jeová Rafá (PSC); o representante do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema), Ivan Carneiro Castanheiro; a representante dos proprietários de chácaras de recreio, Mayara Soares Cardoso, especialista em regularização fundiária urbana; o representante dos moradores do Bairo dos Pires, Wagner Eduardo Shultz; os secretários municipais Daniel de Campos (Negócios Jurídicos), Matias Razzo (Urbanismo), Wagner Marchi (Segurança Pública); e os vereadores Ju Negão (PV), Dr. Júlio (União Brasil), Lu Bogo (PL) e Everton Ferreira (PSD).
O presidente da Comissão, Helder do Táxi, abriu os trabalhos destacando a importância da audiência para que ambos os lados presentes, sitiantes e proprietários de chácaras, entrem em um entendimento. Ceará afirmou que o debate é um ato de cidadania, pois permite que ambos os lados sejam ouvidos, e Waguinho pontuou que o assunto traz muita preocupação para ambos os lados.
Posicionamento da Secretaria de Negócios Jurídicos
O secretário Daniel de Campos afirmou que o município mantém o entendimento de que há uma data limite para a regularização fundiária, conforme estabelece a legislação federal (Lei Nº 13.465, de 11 de julho de 2017), ratificada pela Lei Complementar Nº 813/2018, aprovada em Limeira, e informou aos presentes que há um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional que prevê a alteração desse marco legal. “Embora haja aqueles que defendem que não existe uma data, se existe um projeto de lei no âmbito federal para alterar o prazo é porque ele existe e esse é o entendimento do Congresso Nacional”, argumentou, complementando que o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo, do Ministério Público (MP) de São Paulo, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul é o mesmo, tendo como exceção somente o Colégio Notarial de Minas.
O secretário encerrou sua fala afirmando que no momento não é possível ampliar a data para regularização por causa da fixação da lei federal. “Enquanto não houver permissivo legal, a Prefeitura cumprirá com a lei em vigor: parcelamento ilegal é crime”, defendeu e disse que o Executivo tomará as medidas cabíveis para evitar que novos parcelamentos ilegais ocorram. “A nós compete cumprir a lei e continuaremos fazendo isso. Se houver alteração na legislação federal, abriremos a discussão, daquilo que é viável, para atender todos aqueles que foram vítimas dos criminosos parceladores de solo”.
Posicionamento da Secretaria de Urbanismo
Matias Razzo abordou o assunto pelo viés da proteção ambiental. Segundo ele, o parcelamento irregular de solo é mais danoso do que o mero descumprimento da norma legal, pois é feito de maneira desordenada, sem critérios e pode afetar a disponibilidade da água que abastece a cidade, a vegetação, o meio ambiente e a agropecuária, porque leva para a zona rural uma utilização do solo diferente da nativa dela, que é plantar, cultivar e criar animais, por exemplo. Ele ressaltou que os bairros rurais ficam na macrozona de preservação de mananciais e deve ser preservada, pois é daquela região que é captada a água que abastece todos os 310 mil habitantes da cidade.
“Um parcelamento ilegal, que visa a exploração por completo das áreas, é feito em completa discordância da lei de parcelamento do solo federal e do Plano Diretor Municipal, que exige áreas verdes, áreas institucionais, sistema viário e demais áreas públicas a serem doadas”, informou, explicando que um parcelamento regular de solo dentro das premissas legais somente pode ser feito atendendo a estes requisitos, com prévia aprovação da Prefeitura e prévio registro no cartório.
Posicionamento da Secretaria de Segurança Pública
Wagner Marchi reforçou que a sociedade vive em um estado democrático de direito e, portanto, precisa obedecer às leis. “O princípio da legalidade está acima de tudo, independentemente das nossas expectativas e vontades, o que está determinado dentro da legislação deve ser alcançado. O regramento existe para tecer um comportamento organizado dentro da sociedade”, lembrou.
O secretário esclareceu que o dever das forças de segurança do município é auxiliar a população. “Se os senhores foram levados ao erro, e pela boa fé tiveram algum prejuízo, nós estamos aqui, com todas as forças de segurança atuando de forma conjunta com o Poder Judiciário para, de todas as formas, proteger o direito dos senhores. Se alguém os lesou, deverá ser responsabilizado”.
Posicionamento dos sitiantes
Wagner Shultz, representando os moradores do Bairro dos Pires, afirmou que os sitiantes não são contra a implantação de novas chácaras, condomínios ou terrenos, desde que sejam respeitados os requisitos necessários de acordo com a legislação vigente e que a aprovação seja feita pelos órgãos competentes, mas que são contra o parcelamento irregular de solo na zona rural, sem critérios técnicos e em muitos casos acarretando contaminação do solo, nascentes, riachos e rios da região, onde grande parte dos produtores rurais tiram o próprio sustento. “Recentemente alguns produtores elaboraram um estudo que aponta haver cerca de 60 novos loteamentos irregulares entre os anos de 2016 a 2021, que totalizam mais de 3 milhões de metros quadrados, equivalentes a aproximadamente 3.500 chácaras feitas de forma irregular, sem estudo ou aprovação”, afirmou.
O representante lembrou do Plano Diretor Territorial da cidade, que estabelece que os bairros dos Pires e Pinhal estão inseridos na macrozona de proteção aos mananciais, definidos como áreas de proteção e recuperação dos mananciais com vistas ao abastecimento humano. “É justamente lá que estão concentrados o maior número de núcleos de loteamentos irregulares. Onde era para ser preservado para o nosso futuro é o local que está sendo mais contaminado e mais desrespeitado em relação ao meio ambiente”, ponderou.
Posicionamento dos donos de chácaras
Mayara Soares, representando os proprietários de chácaras, disse estar surpresa e chateada pelos discursos dos demais participantes do debate. Segundo ela, existe um marco para a regularização de posse, mas não há para a regularização fundiária e por isso defendeu que os proprietários têm o direito da regularização pelo título de legitimação fundiária, defendendo que o prazo é estabelecido apenas para uma modalidade de regularização, mas que existem outros instrumentos que a possibilitam.
“Todos têm dito que vocês são vítimas dos criminosos parceladores de solo, mas vocês também são vítimas da omissão fiscalizatória do município”, defendeu e questionou o que será feito com as pessoas que já construíram e moram em suas casas. “As vítimas de 2015 são as mesmas de 2018, então não podemos ter essa divisão na população de que metade tem direito à regularização e a outra não. Estamos falando de moradia”, ponderou.
Posicionamento do Gaema
O professor Ivan Carneiro destacou que a zona rural tem vocações agrícolas e pecuárias e quando há um parcelamento que se expande muito para a zona rural há dificuldades pela distorção do uso e pelos custos de oferecer serviços como de água e esgoto que não podem ser sanadas por equipamentos como fossa filtro e poços cacimba. Ele também citou que, desde 2000, a Corregedoria já proíbe que cartórios registrem parcelamentos clandestinos. “Todos sabem, inclusive engenheiros e corretores, que já não sai a escritura", apontou.
O promotor do Gaema pontuou que não deve haver discussão sobre a validade da lei federal ou estadual em Limeira, uma vez que a legislação municipal é clara quanto ao prazo que vale para todas as modalidades de parcelamento. “Quem comprou um parcelamento que não estava previsto na lei municipal podia não estar ciente, mas poderia ter alcançado o objetivo da lei, até porque o desconhecimento da lei não pode ser alegado por ninguém”, alertou, informando quais medidas a Prefeitura pode tomar com relação aos núcleos irregulares, como o ingresso de uma ação civil pública para desfazimento, para reparação do dano e para a indenização dos compradores de lotes irregulares.
Ivan acredita que o não estabelecimento de limite de data pode incentivar a criação de novos parcelamentos irregulares. “Como eu previno novos núcleos informais se eu digo assim ‘pode fazer errado agora que daqui cinco ou dez anos, quando esse loteamento se consolidar, ele pode ser regularizado’?”, exemplificou.
Considerações finais
O vereador Waguinho questionou, se caso um projeto de lei mais flexível quanto à data limite de regularização fosse aprovado pela Câmara, qual a possibilidade dele ser declarado inconstitucional pelo MP. Ivan disse que o procurador Luiz Alberto Segalla Bevilacqua o informou que estaria predisposto a fazer uma representação quanto à constitucionalidade de um projeto nesse sentido e que existe, inclusive, a possibilidade de recomendação ao prefeito para vetar a proposta devido ao vício de iniciativa.
Waguinho também questionou se as famílias que já construíram suas residências nos lotes parcelados de forma irregular correm o risco de terem seus imóveis demolidos. O secretário Jurídico, Daniel de Campos, disse que a iniciativa, no momento, é de embargar os loteamentos. “A Prefeitura não tem intenção de derrubar a casa de ninguém, mas temos que obedecer às leis”, afirmou, destacando que o procedimento necessário para chegar às vias de fato de derrubar os imóveis seria fazer uma representação junto ao Judiciário, dando a chance de ampla defesa, e que a decisão caberia à justiça.
Para encerrar, os membros da Comissão de Obras deixaram claro aos presentes que são representantes de toda a população limeirense e que não favorecem um lado em detrimento de outro. “Nosso compromisso é com cada um dos munícipes. Faremos outras reuniões e tenho certeza que os 21 vereadores farão o possível para atender as necessidades de vocês”, disse Helder.
A audiência foi transmitida ao vivo pelos canais de comunicação da Câmara e pode ser conferida na íntegra pelo link.
A Comissão
A Comissão de Obras, Serviços Públicos, Planejamento, Uso, Ocupação e Parcelamento do Solo é responsável por fiscalizar obras e serviços públicos realizados ou prestados pelo município, bem como os planos habitacionais elaborados ou executados pelo poder público. Também é responsável por analisar concessão administrativa ou direito real de uso de bens imóveis e móveis de propriedade do município; transporte coletivo e individuais, frete e carga, utilização das vias urbanas e estradas municipais, sinalização; meios de comunicação; serviços públicos de concessão estadual ou federal que interessem ao município; cadastro territorial, planos gerais e parciais de urbanização ou reurbanização; plano diretor; e disciplinação das atividades econômicas desenvolvidas.