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Câmara investiga denúncia de violência obstétrica em Limeira

Relatório final será elaborado pela Comissão de Direitos Humanos  

Data de publicação: 18/11/2016 18:42 | Categoria: Do Gabinete | Fonte: Do Gabinete Parlamentar


Por um ano e três meses, a dona de casa Marcia Aparecida Martins Candiotto manteve em silêncio a denúncia de possíveis abusos que sofreu ao dar à luz. Foi motivada por amigos próximos à família que a limeirense decidiu compartilhar o drama vivido e levar o caso à Comissão Permanente de Defesa dos Direitos Humanos da Câmara Municipal. Na acusação apresentada aos vereadores, em setembro deste ano, ela revelou o sofrimento no parto que pode ter causado danos ao cérebro do bebê, hoje com sequelas.    

Grávida do terceiro filho, Márcia planejava no pré-natal um procedimento cesáreo, como nas gestações anteriores. A primeira surpresa veio quando com 34 semanas a bolsa rompeu, ainda em fase prematura. Ela expôs que acionou uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e foi conduzida à maternidade onde possui convênio particular, em Limeira. Na unidade de atendimento, o médico plantonista conversou com pré-natalista da denunciante que foi informada de que ficaria apenas em observação.   

“Sem eu esperar, e sem nenhuma explicação, começaram a induzir o parto normal. Naquele momento eu não sentia dor, mesmo sem contração alguma o obstetra insistentemente fazia exames de toque a cada dez minutos. Eu estava apavorada, ele pediu para que eu fizesse força, mas como eu iria fazer força? Não estava preparada para isso. Todos os meus partos foram cesáreos”, disse Márcia, informando que, em seguida, vários procedimentos foram adotados para que o parto normal fosse realizado.

Um dos momentos de maior desconforto que ela diz ter vivenciado foi a manobra de Kristeller, a técnica consiste em aplicar pressão no fundo do útero no período expulsivo para adiantar a saída do bebê. “O médico pediu para a enfermeira subir em minha barriga para ajudar o nenê a nascer. Aquilo foi monstruoso, desumano. Eu estava exausta. O que eu esperava era ouvir o choro do meu filho, que não veio, depois de longos 35 minutos”, desabafou.

Para que Márcia pudesse dar à luz, a equipe obstétrica fez uma episiotomia (corte na genitália feminina) com o objetivo de facilitar a saída do bebê. “Ao invés de me acalmar e tentar me explicar tudo que havia acontecido, o médico deu alguns ‘tapinhas nas minhas costas’ e falou: ‘não ajudou em nada, hein! ’”, retratou. Ao final do parto, a criança nasceu sem responder a estímulos e precisou ser reanimada, conforme constam dados nos laudos clínicos anexados ao processo investigado pela Câmara de Vereadores. O diagnóstico aponta depressão neonatal grave que evoluiu para uma boa recuperação. O menino foi encaminhado para Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) e, de acordo com o depoimento, a mãe ficou sem informações sobre o filho por cerca de 12 horas. Além disso, o pai ficou durante todo o parto da esposa, do lado de fora, aguardando informações, sem ser orientado sobre o acompanhamento da mulher.   

Com pouco mais de um ano de idade, hoje a criança apresenta um atraso no desenvolvimento motor e da fala, o que também preocupa a mãe sobre o futuro do filho, além das lembranças que guarda de uma série de supostos excessos que diz ter sofrido. É neste ponto que a Comissão de Diretos Humanos da Câmara tem o papel de apurar se houve violação da dignidade da vítima.

O colegiado formado pelos vereadores Wilson Cerqueira (PT), Erika Tank (PR), vice-presidente, Zé da Mix (PSD), André Moisés (PSB) e Dra Mayra Costa (PPS), já fez a juntada de todos os documentos entregues pela denunciante e pela defesa, além de ter coletado o depoimento das duas partes envolvidas. Os profissionais da maternidade ouvidos defendem que os procedimentos médicos adotados estão dentro dos padrões. A previsão, como afirma Cerqueira, é que até dezembro um relatório final seja elaborado com o parecer da Comissão para ser enviado a outros órgãos de competência, como o Ministério Público e Defensoria Pública do Estado de São Paulo.   

Violência  

O relato de Márcia dialoga com a história de milhares de mulheres que sofreram desrespeito no parto. Uma pesquisa feita pela Fiocruz revelou, em 2012, que uma em cada quatro brasileiras foi alvo de violência obstétrica.  O cenário que se repete na história das vítimas é a ausência de zelo na abordagem da equipe de profissionais de saúde com as gestantes, desde discursos em tom irônico ou de intimidação até ofensas verbais. 

Os abusos, quando comprovados, são agora reconhecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e recebem o nome de violência obstétrica, que é caracterizada pela desumanização no processo reprodutivo feminino, provocando a perda de autonomia e impactos negativos na qualidade de vida da mulher. Mais que uma questão de saúde, o que a definição revela é a violação de direitos fundamentais.